São cantos, cânticos e canções, todos anônimos. Os sons emitidos entre as árvores das florestas, parques das cidades e flores dos jardins são exalados pelos pássaros. Encantam os sentidos humanos, em aventuradas viagens ou em miniecossistemas caseiros.
Cada melodia torna-se o fundo musical da vida dos brasileiros, privilegiados em variedades de espécies. As composições da natureza traduzem o amor, a amizade, a saudade, a sensibilidade.
Milhões de pessoas de todo o mundo buscam estas interpretações, cultivando a observação de pássaros. Enquanto isso, os tons e as cores sobrevoam a rotina e pincelam os espaços em agradecimento ao dom de voar.
Passarinhos seduzem a atenção dos homens em todos os cantos. Entre os passos habituados, algumas pessoas param e escutam. O deslumbramento pode ser certeiro e, logo, cultivado em jardins; em lares.
Nesta paixão, gaiola não é enfeite
A beleza maior é a liberdade dos cantadores, que descobrem miniecossistemas instalados em casas. A atração das aves pode ser feita com alimentos em comedouros, bebedouros com água açucarada para beija-flores, plantio de espécies vegetais atrativas ou, ainda, fontes diversas de água, como bacias, pequenos lagos e caixas que servem de locais para ninhos.
“Os benefícios da observação de pássaros, além do aprendizado constante, começam pela caminhada, pela atividade física praticada, muitas vezes, em locais de ar puro. E também se dão com o prazer, relaxamento e descanso mental, que se unem às reflexões individuais ou ao convívio e companheirismo com grupos”.
A obervação de pássaros, também conhecida como birdwatching, pode ser tornar um hobby para aqueles que se agradam com a visita de aves em seus quintais. Porém, o gosto e a dedicação podem aumentar e o primeiro sinal é a procura por aprendizado, a leitura assídua sobre o tema, o contato com pessoas experientes, com grupos de discussões ou com entidades de observadores.
Hoje (lá em 2008) a internet, por exemplo, (já oferecia) oferece ferramentas, desde guias interativos até buscas por imagens e vocalizações, que ajudam a entender e a identificar as aves avistadas. Com conhecimento e interesse, logo inicia uma maior atenção aos pássaros em passeios urbanos ou em parques vizinhos e as viagens em busca de novos sons, novas cores, novas espécies.
Além das vivências em diversos cenários, principalmente perto de rios, lagos e águas em geral, a aparência do observador também pode ser modificada.
Com o tempo, podem entrar em cena as roupas, acessórios e equipamentos, para sofisticar a atividade: máquina fotográfica, filmadora, tripé, GPS, trena, paquímetro, alicates, cordas para escalar, bota de borracha para vadear riachos e entrar em áreas encharcadas, facão para abrir trilhas, repelentes de insetos, anestésicos usados em dor de dente para passar em picadas de marimbondos ou pele ofendida por urtiga, etc.
Ao se entregar à aventura, chegando a um ponto escolhido, o olhar acompanha o vôo e se realiza num pouso
O canto que antes era anônimo se torna atração. Neste momento, até mesmo a respiração do observador é reduzida com os movimentos. Imóvel, o espectador tenta a invisibilidade para conquistar alguns segundos perto do voador.
Em qualquer ensejo do dia eles são admirados. Porém, a natureza se incumbe de estabelecer efeitos e encontros. As primeiras horas da manhã e as últimas horas do dia são as melhores para a observação da revoada. Ocasiões para avistar também diferentes paisagens de nascer e pôr do sol.
“O melhor lugar para se observar é na hora e no lugar onde você está”
Entrevista com o escritor Carlos Augusto Rizzo
Há 15 anos ele dedica atenção aos pássaros e, há dois, trabalha na Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Ubatuba, no litoral norte de São Paulo, com o projeto de Observação de Aves como Ferramenta para a Educação Ambiental.
Em entrevista exclusiva para a Revista Pesca Brasil, discorre sobre a magia e o encanto proporcionados pela observação desses animais, pelo seu canto a envolver de música e poesias as matas e as florestas desse país tropical e, não raras vezes, também os poluídos centro urbanos. A seguir, os principais trechos da entrevista:
Como as pessoas começam a atividade de observar os pássaros?
Vivemos num país tropical e temos o privilégio de poder abrir a janela da nossa casa ou do nosso escritório e começar a observar. As aves tropicais são mais coloridas, mais canoras, e o melhor, as mais exibicionistas. De janela para a rua, andando a pé até a praça, ou caminhando pelo parque podemos avistar sem equipamentos e a olho nu, perto de 100 espécies de aves diferentes, isto é muito mais do que a avifauna de muitos países. E qualquer um de nós pode alcançar uma marca assim.
Como é um dia de passeio de observação de pássaros?
“No dia do observador, quem mandam são as aves”
É no horário delas que devemos nos limitar. O dia começa aos primeiros raios de sol, horário ruim para fotografar, mas ótimo para ouvir e aprender as vocalizações. A manhã se estende até 11 horas e a parte da tarde deve começar por volta das 15 horas e se encerrar ao pôr do sol.
A temperada de observação no Brasil começa em maio e se estende até novembro. Nessa época, temos a predominância de estrangeiros que preferem temperaturas mais amenas. O inverno provoca falta de alimentos na mata e obriga as aves a virem para as bordas, onde é mais fácil de observá-las.
A primavera é o início do ciclo reprodutivo e torna outubro o melhor mês para se observar. Os juvenis estão emplumados e se apresentam com as cores mais vivas e bonitas. Os dias chuvosos indicam um ótimo dia seguinte para observação. Parece que as aves ficam mais agitadas.
Como esta prática pode ser utilizada na educação ambiental?
Na educação ambiental são várias as possibilidades. O levantamento das aves de um lugar pode indicar tanto a degradação, como o tipo de urbanização e a integridade do local. As aves são a referência do uso dado a cada ambiente e isto é muito fácil e prazeroso de se perceber e aprender.
Utilizando métodos simples para identificação de aves se aprende geografia, física, português, inglês e até a utilização na alfabetização de crianças especiais ou como atividade para pessoas com deficiência visual, que são ótimos identificadores de aves através das vocalizações.
O método didático desenvolvido pela Secretaria de Meio Ambiente de Ubatuba, em parceria com o Conpet/Petrobas, é utilizado em escolas e município e também em algumas cidades de Goiás, Santa Catarina, Paraná, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Os pássaros também sofrem com problemas ambientais brasileiros? O que cada um pode fazer pela preservação deles?
As aves são as primeiras sinalizadoras da degradação de um ambiente. Elas mesmas pouco sofrem, pois batem asas e voam para outro lugar. Nós somos muito mais penalizados com a perda de qualidade de vida, pela ausência das aves no nosso dia a dia. E existem aquelas que não sobrevivem em outros ambientes, ficando expostas ao risco de extinção.
Podemos fazer muito com atitudes simples, plantar árvores frutíferas, oferecer água para os beija-flores, cuidar dos animais domésticos para que eles não se tornem predadores de aves e sinalizar as grandes vidraças para evitar colisões. Além de divulgar e praticar a observação de aves, como uma ferramenta de alerta sobre os cuidados que devemos ter com o nosso ambiente em prol de uma melhor qualidade de vida.
O Brasil é caracterizado por inúmeros ecossistemas e possui cerca de 1800 espécies de aves diferentes. A diversidade surpreende e encanta os amantes da natureza, sejam em centros urbanos, florestas, parques ou passeios. A Floresta da Tijuca no Rio de Janeiro, o Parque do Ibirapuera e o da Luz em São Paulo, o passeio público em Curitiba são alguns exemplos de locais indicados.